«All that is necessary for the triumph of evil is that good men do nothing» (Edmund Burke)

terça-feira, 29 de março de 2011

Uma conversa surreal... ou não!


Não resisti a transcrever aqui um email que um amigo me enviou a respeito de um tema que me é caro: para que pagamos impostos, afinal?

É uma conversa fictícia entre um contribuinte e o Estado:


Contribuinte: Gostava de comprar um carro.

Estado: Muito bem. Faça o favor de escolher.

Contribuinte: Já escolhi. Tenho que pagar alguma coisa?

Estado: Sim. Imposto sobre Automóveis (ISV) e Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).

Contribuinte: Ah... Só isso.

Estado: ... e uma coisinha para o pôr a circular: o selo.

Contribuinte: Ah!..

Estado: ... E mais uma coisinha na gasolina necessária para que o carro efectivamente circule. O ISP.

Contribuinte: Mas... sem gasolina eu não circulo.

Estado: Eu sei.

Contribuinte: ... Mas eu já pago para circular...

Estado: Claro!...

Contribuinte: Então.. vai cobrar-me pelo valor da gasolina?

Estado: Também. Mas isso é o IVA. O ISP é uma coisa diferente.

Contribuinte: Diferente?!

Estado: Muito. O ISP é porque a gasolina existe.

Contribuinte: ... Porque existe?!

Estado: Há muitos milhões de anos os dinossauros e o carvão fizeram petróleo. E você paga.

Contribuinte: ... Só isso?

Estado: Só. Mas não julgue que pode deixar o carro assim como quer.

Contribuinte: Como assim?!

Estado: Tem que pagar para o estacionar.

Contribuinte: ... Para o estacionar?

Estado: Exacto.

Contribuinte: Portanto, pago para andar e pago para estar parado?

Estado: Não. Se quiser mesmo andar com o carro precisa de pagar seguro.

Contribuinte: Então, pago para circular, pago para poder circular e pago por estar parado.

Estado: Sim. Nós não estamos aqui para enganar ninguém. O carro é novo?

Contribuinte: Novo?

Estado: É que se não for novo tem que pagar para vermos se ele está em condições de andar por aí.

Contribuinte: Pago para você ver se pode cobrar?

Estado: Claro. Acha que isso é de borla? Só há mais uma coisinha...

Contribuinte: ... Mais uma coisinha?

Estado: Para circular em auto-estradas...

Contribuinte: Mas... mas eu já pago imposto de circulação.

Estado: Pois. Mas esta é uma circulação diferente.

Contribuinte: ... Diferente?

Estado: Sim. Muito diferente. É só para quem quiser.

Contribuinte: Só mais isso?

Estado: Sim. Só mais isso.

Contribuinte: E acabou?

Estado: Sim. Depois de pagar os 25 euros, acabou.

Contribuinte: Quais 25 euros?!

Estado: Os 25 euros que tem de pagar para andar nas auto-estradas.

Contribuinte: Mas não disse que as auto-estradas eram só para quem quisesse?

Estado: Sim. Mas todos pagam os 25 euros.

Contribuinte: Quais 25 euros?

Estado: Os 25 euros é quanto custa o chip.

Contribuinte: ... Custa o quê?

Estado: Pagar o chip. Para poder pagar.

Contribuinte: Não percebi...

Estado: Sim. Pagar custa 25 euros.

Contribuinte: Pagar custa 25 euros?

Estado: Sim. Paga 25 euros para pagar.

Contribuinte: Mas eu não vou circular nas auto-estradas.

Estado: Imagine que um dia quer? Tem que pagar.

Contribuinte: Tenho que pagar para pagar porque um dia posso querer?

Estado: Exactamente. Você paga para pagar o que um dia pode querer.

Contribuinte: E se eu não quiser?

Estado: Paga multa!

terça-feira, 22 de março de 2011

Sócrates e a carga da Brigada Ligeira

"Half a league half a league,
Half a league onward,
All in the valley of Death
Rode the six hundred:
‘Forward, the Light Brigade!
Charge for the guns’ he said:
Into the valley of Death
Rode the six hundred."


(Lord Tennyson, "The Charge Of The Light Brigade")


O que têm em comum Pedro Santana Lopes e José Sócrates? A meu ver, apenas uma coisa: a fuga para a frente como única possibilidade de sobreviver politicamente.

Santana arriscou tudo em troca de um pequeno e inglório vislumbre do Poder, numa campanha que fez lembrar a carga da Brigada Ligeira na batalha de Balaclava, que o génio de Tennyson imortalizou. E Sócrates segue pelo mesmo caminho, colocando a Oposição numa situação em que se vê forçada a derrubar o Governo com o chumbo do famigerado PEC IV. É a fuga para a frente, o seja-o-que-Deus-quiser, o vai-ou-racha, o tudo ou nada...

Porém, a jogada do ainda primeiro-ministro consegue ser mais inteligente que a do seu predecessor - já para não falar de Lord Cardigan, o comandante da infeliz Brigada Ligeira.

Após a recente cimeira europeia, José Sócrates tomou consciência que o recurso à ajuda externa será inevitável. Embora já o esperasse há meses - e daí a adopção de uma estratégia partidária centrada no lema "defender Portugal do FMI", enquanto Passos Coelho afirmava em entrevistas que não se importaria de governar com o Fundo...

Neste contexto, a única forma de Sócrates evitar a sua morte política passa por conseguir deitar as culpas da bancarrota do País e do recurso ao FMI para a Oposição. E a verdade é que, com esta manobra, as hipóteses de o PS vencer as próximas eleições continuam a não ser famosas, mas ainda assim existem. Sócrates tem ainda uma pequena hipótese de vencer e, conhecendo a sua personalidade, será de esperar que a aproveite ao máximo.

A seu favor, tem a lealdade do eleitorado tradicional do PS e a ignorância do português comum em relação aos assuntos económicos e ao funcionamento dos mercados financeiros.

Além disso, a forma como o primeiro-ministro procurou alcançar este objectivo demonstrou mais uma vez o seu brilhantismo táctico: primeiro criou uma crise institucional, ao não informar o Presidente e o PSD das medidas que acordara com Bruxelas. Medidas estas que, por serem tão duras, colocam a Oposição entre a espada e a parede.

Depois desvalorizou a situação e acusou a Oposição de exagerar a questão para criar uma crise política. E agora várias figuras do PS surgem a apelar ao bom senso, à moderação e à intervenção de Cavaco Silva para serenar os ânimos. Um extra-terreste que chegasse agora a Portugal pensaria que a responsabilidade da crise política é exclusivamente do PSD e que este partido governa o País há seis anos.

O mais irónico é que Sócrates pode sair a ganhar das duas formas. Pois se, ao contrário do que se espera, o PEC IV for hoje viabilizado no Parlamento, o Governo fica com condições para de facto meter as contas em ordem. Reparem que não foi por não saber o que é preciso fazer que o Governo não tomou as medidas necessárias, ao longo dos últimos seis anos. A rapidez com que avançaram com medidas como o descongelamento das rendas demonstra-o.

Mas será esta táctica suficiente para garantir a sobrevivência política do primeiro-ministro, ou não passará de uma cavalgada suicida, como a de Cardigan na Crimeia? Só o tempo dirá. Mas é provável que Sócrates consiga manter-se à frente do Partido Socialista, mesmo que perca as próximas eleições... mantendo-se assim na primeira linha da vida política nacional.

(Texto publicado também no Farpas)

sexta-feira, 18 de março de 2011

Geração rasca à rasca

Por motivos que me são alheios, o texto que se segue foi escrito para um jornal on-line e não chegou a ser publicado. Data de inícios de Março. A ler:

Geração rasca à rasca

Em 1994, altura em que se aproximava o meu ingresso no Ensino Superior e em que as políticas educativas eram, já, sobejamente contestadas, os estudantes do secundário e do superior promoveram uma série de manifestações pelo país para tentar alertar para os problemas futuros que dessas políticas poderiam advir. Vicente Jorge Silva, à época director do jornal Público, foi autor de um editorial em que apelidava a minha geração de “Geração Rasca”. Resumindo o texto (que conservo bem recortado nos meus arquivos de textos que adivinho que ainda darão que falar, no futuro), Vicente Jorge Silva achava que não passávamos de uns insurrectos irresponsáveis sem objectivos, para nós e para o país, minimamente definidos.
17 anos passados, essa mesma geração que não teria motivos para ter vindo para as ruas, na visão de Vicente Jorge Silva e de muitos dos que, na altura, o aplaudiram, está a braços com o desemprego e a precariedade laboral, em que as licenciaturas ou especializações de nada valem. Uma geração de biscateiros se houver a sorte de encontrar um biscate. Veja-se, a este exemplo, os Censos 2011, a que milhares de licenciados concorreram para, em curtos 2 meses e com remuneração exígua, fazerem o levantamento da população e da habitação no território nacional. Gostava, sinceramente, de ouvir/ler a actual opinião do ex-director do Público, posterior deputado do Partido Socialista.
A “Geração Rasca” passou, então, agora, a ser a “Geração à Rasca”, nome dado ao movimento gerado no Facebook que organiza uma manifestação nacional já no próximo dia 12 de Março. Esta manifestação, que se pauta pela originalidade de não surgir de qualquer partido político, sindicato, grupo politizado ou afins, convoca todos os “desempregados, quinhentoseuristas e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolseiros, trabalhadores-estudantes, estudantes, mães, pais e filhos de Portugal!”. Adivinho, já, por motivos óbvios, uma forte adesão, tal como adivinho, já, por motivos políticos e sociais, a manutenção do statu quo (chamem-me pessimista ou realista, ambos os epítetos me assentam e são, cada vez mais, sinónimos).

PS – Aconselha-se, vivamente, a leitura deste texto ao som da polémica “Parva que Sou”, dos Deolinda. Goste-se ou não (e já muito se leu a favor e contra), a voz de Ana Bacalhau vale sempre a pena ser ouvida.

A retirada dos Estados Unidos e o renascer da Entente?

A presente crise líbia deu origem a um fenómeno geopolítico muito interessante que, talvez devido ao ritmo dos acontecimentos, tem escapado à atenção da maior parte dos 'media' globais. Refiro-me ao aparente ressuscitar da centenária entente cordiale enquanto 'player' militar verdadeiramente actuante no Mediterrâneo, 55 anos depois do desaire do Suez.

Com efeito, a ofensiva de Khadafi contra o derradeiro bastião rebelde em Benghazi foi travada devido a um ultimato do Reino Unido e da França, duas potências europeias que a sabedoria convencional há muito havia condenado ao declínio geopolítico.

Ao contrário do que normalmente sucederia, a liderança da coligação internacional que se opõe ao regime de Khadafi não cabe aos Estados Unidos. Isto nota-te até nos protestos anti-ocidentais nas ruas de Tripoli: os manifestantes gritam juras de ódio à França e à Grã-Bretanha, mas não aos Estados Unidos.

E ao contrário do que se poderia pensar à primeira vista, tal não será apenas uma manobra de relações públicas ou uma forma elaborada de fazer a guerra por procuração, por parte da administração Obama. Nas negociações que tiveram lugar nas últimas semanas, com vista à imposição de uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia, os EUA foram altamente pressionados pelos seus parceiros europeus para assumirem a liderança de uma coligação anti-Khadafi, mas recusaram-se a fazê-lo e até a comprometerem meios substanciais na região. Perante esta atitude, os governos da França e do Reino Unido chegaram a admitir agirem sozinhos e sem mandato da ONU.

Mas a que se deve a pressa e a arrogância quase imperial por parte de Sarkozy e Cameron? E porquê a passividade dos EUA? Como é evidente, a resposta a este enigma reside no interesse nacional da França e da Inglaterra, que continuam a ser as duas únicas potências militares credíveis da Europa.

Antes de mais, Khadafi é uma ameaça maior para a Europa do que para os EUA. Um regime hostil e apoiante do terrorismo, situado a apenas 750 milhas do Sul de França, será um pesadelo. Por outro lado, há que não esquecer que o ditador líbio prometeu expulsar as petrolíferas britânicas e francesas que exploram crude no seu país, entregando as concessões a grupos chineses e indianos. E, além disso, ameaçou abrir os portões da Europa a milhões de africanos famélicos. Se sobreviver, o regime de Khadafi converter-se-á numa ameaça muito séria para o Velho Continente.

Por isso, ao contrário do que aconteceu na Bósnia e no Kosovo, os europeus não esperaram que os americanos agissem. Será o fim de uma era e o começo de uma nova? Só o tempo dirá.

O certo é que, no Reino Unido, já se fala do cancelamento dos cortes nos gastos com a Defesa que o governo Cameron pretende realizar. Os britânicos têm cada vez maior consciência de que, a prazo, os Estados Unidos vão dedicar-se cada vez menos à defesa da Europa e que esta terá de ser defendida pelos seus naturais.

Ronald Reagan, que nos anos 80 bombardeou a própria casa de Khadafi, deve estar às voltas no túmulo. Porque não agem os Estados Unidos? A resposta a esta questão reside num 'cocktail' de vários factores: o 'síndroma' do Iraque, o receio de alimentar ódios no mundo árabe e a perda de relevância da Europa e do Mediterrâneo na estratégia dos Estados Unidos (que agora estão mais focados na Ásia-Pacífico). Ou seja, à retirada do 'império'.

(Publicado também no Farpas)

quinta-feira, 17 de março de 2011

O Governo À Rasca

O principal problema deste governo é o de ser parte integrante da geração à rasca. Lá no fundo, como muitos outros cidadãos, querem emigrar, ser governo num outro país – um qualquer, em que exista maior estabilidade e bem menos problemas. Também eles querem mudar de governo, mas não o podem dizer, porque são o governo e o objectivo do governo é ser poder.

Tal como os jovens da geração à rasca, este governo também é precário – é um governo a recibos verdes, sem saber como será o futuro. E, como os jovens à rasca, a sua grande ambição é ser do quadro, ter uma maioria absoluta. Enfim, encontrar alguma estabilidade, que lhe permita sair de casa dos pais e montar uma sua, que lhe dê hipótese de constituir família, sem o empecilho do partido, como fez Cavaco Silva.

São expectativas aceitáveis e compreensíveis.

O problema é que a situação não se confina a isto: o governo é, também, como a geração dos pais da geração à rasca: farta-se de pagar, está envidado até ao tutano – entre as dívidas herdadas e as novas, contraídas para manter o estilo de vida, está à beirinha de cortar os pulsos. E já não consegue contentar quem quer que seja.

Por isso, dizem que no tal sábado de todas as manifestações, no dia 12 de Março e 2011, o governo reuniu-se num conselho de ministros extaordinário, nos jardim da residência oficial do primeiro-ministro, em S. Bento, para se manifestar, empunhando cartazes e bradando palavras de ordem.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Energia verde


O sismo, seguido de Tsunami, que atingiu o Japão está a provocar o pânico nuclear. As explosões dos reactores na central de Fukushima podem originar uma verdadeira catástrofe, com consequências bem piores do que o próprio terramoto.

Foi necessário um incidente desta envergadura para que os chamados países nucleares, como a Alemanha, Rússia ou França tomassem medidas. Centrais nucleares vão ser encerradas, outras analisadas. Só na Europa são cerca de 160… Portugal não tem energia nuclear, mas um qualquer desastre em países vizinhos, como a Espanha (que conta com seis centrais nucleares e oito reactores) pode afectar-nos.

Esta é uma boa altura para enfatizar uma opinião que sempre tive. Uma das maiores, senão mesmo a mais importante, herança que o Governo Sócrates vai deixar ao povo português é a aposta nas energias verdes, com o novo investimento em barragens e, sobretudo, com a força das eólicas.

Hoje esta energia pode ainda ser muito cara, mas o tempo fará dela o futuro. E, pelo menos nisto, Portugal está na liderança mundial. O crédito tem de ser entregue a quem o tem e aqui ele pertence muito a Manuel Pinho, o ministro que se demitiu depois de apontar um ‘par de cornos’ ao deputado do PCP Bernardino Soares.

Nem tudo são más notícias!





Segundo notícias vindas a lume, no caldeirão em que se transformou este país, existe a intenção de tributar o golfe a 6% de IVA. Acho muito bem, afinal de contas um desporto de massas e com benefícios para as massas deve ser descriminado em relação aos desportos elitistas que grassam por esse mundo fora. Meu senhores, lembro-me, como se fosse hoje, que desde os meus tempos de infante que o golfe faz parte da minha vida. Recordo-me, com uma exactidão de arrepiar, que após a escola, enquanto uns, poucos rebeldes, jogavam à bola (esse desporto de burgueses) no meio da estrada, outros, felizmente a maioria, havia que se dedicavam, certamente contagiados pelo facto de ser uma disciplina, que desde sempre fez, parte dos programas de educação física, no interior dos clubes (quais condomínios privados) a jogar golfe. Ora, como em tudo na vida, de imberbe passei a jovem adulto (essa etapa da vida cheia de facilidades) e reparei que os adereços que usava já não servem (maldita ditadura da moda e do crescimento corporal). Por isso, com licença. Vou pegar no meu iate, movido a gasóleo agrícola, e vou a Monte Carlo, comprar os meus sapatos CAT, a camisola louis vuitton, o chapéu dior, o saco burberry, as luvas versace, o trolem/buggy Frazer e o taco de madeira, aço, ferro e até de gelatina. E porque já estou num centro comercial gigante, após todos estes apetrechos, aproveito e abasteço-me, a uma taxa inferior à praticada em Portugal, dos víveres necessários à minha sobrevivência. Desculpem ter de ser breve, mas tenho que me despachar, visto amanhã, logo de manhã, participar numa palestra, paga (tempo é dinheiro), no clube de golfe, sobre como os portugueses devem apertar o cinto em nome da prosperidade do país.