«All that is necessary for the triumph of evil is that good men do nothing» (Edmund Burke)

terça-feira, 22 de março de 2011

Sócrates e a carga da Brigada Ligeira

"Half a league half a league,
Half a league onward,
All in the valley of Death
Rode the six hundred:
‘Forward, the Light Brigade!
Charge for the guns’ he said:
Into the valley of Death
Rode the six hundred."


(Lord Tennyson, "The Charge Of The Light Brigade")


O que têm em comum Pedro Santana Lopes e José Sócrates? A meu ver, apenas uma coisa: a fuga para a frente como única possibilidade de sobreviver politicamente.

Santana arriscou tudo em troca de um pequeno e inglório vislumbre do Poder, numa campanha que fez lembrar a carga da Brigada Ligeira na batalha de Balaclava, que o génio de Tennyson imortalizou. E Sócrates segue pelo mesmo caminho, colocando a Oposição numa situação em que se vê forçada a derrubar o Governo com o chumbo do famigerado PEC IV. É a fuga para a frente, o seja-o-que-Deus-quiser, o vai-ou-racha, o tudo ou nada...

Porém, a jogada do ainda primeiro-ministro consegue ser mais inteligente que a do seu predecessor - já para não falar de Lord Cardigan, o comandante da infeliz Brigada Ligeira.

Após a recente cimeira europeia, José Sócrates tomou consciência que o recurso à ajuda externa será inevitável. Embora já o esperasse há meses - e daí a adopção de uma estratégia partidária centrada no lema "defender Portugal do FMI", enquanto Passos Coelho afirmava em entrevistas que não se importaria de governar com o Fundo...

Neste contexto, a única forma de Sócrates evitar a sua morte política passa por conseguir deitar as culpas da bancarrota do País e do recurso ao FMI para a Oposição. E a verdade é que, com esta manobra, as hipóteses de o PS vencer as próximas eleições continuam a não ser famosas, mas ainda assim existem. Sócrates tem ainda uma pequena hipótese de vencer e, conhecendo a sua personalidade, será de esperar que a aproveite ao máximo.

A seu favor, tem a lealdade do eleitorado tradicional do PS e a ignorância do português comum em relação aos assuntos económicos e ao funcionamento dos mercados financeiros.

Além disso, a forma como o primeiro-ministro procurou alcançar este objectivo demonstrou mais uma vez o seu brilhantismo táctico: primeiro criou uma crise institucional, ao não informar o Presidente e o PSD das medidas que acordara com Bruxelas. Medidas estas que, por serem tão duras, colocam a Oposição entre a espada e a parede.

Depois desvalorizou a situação e acusou a Oposição de exagerar a questão para criar uma crise política. E agora várias figuras do PS surgem a apelar ao bom senso, à moderação e à intervenção de Cavaco Silva para serenar os ânimos. Um extra-terreste que chegasse agora a Portugal pensaria que a responsabilidade da crise política é exclusivamente do PSD e que este partido governa o País há seis anos.

O mais irónico é que Sócrates pode sair a ganhar das duas formas. Pois se, ao contrário do que se espera, o PEC IV for hoje viabilizado no Parlamento, o Governo fica com condições para de facto meter as contas em ordem. Reparem que não foi por não saber o que é preciso fazer que o Governo não tomou as medidas necessárias, ao longo dos últimos seis anos. A rapidez com que avançaram com medidas como o descongelamento das rendas demonstra-o.

Mas será esta táctica suficiente para garantir a sobrevivência política do primeiro-ministro, ou não passará de uma cavalgada suicida, como a de Cardigan na Crimeia? Só o tempo dirá. Mas é provável que Sócrates consiga manter-se à frente do Partido Socialista, mesmo que perca as próximas eleições... mantendo-se assim na primeira linha da vida política nacional.

(Texto publicado também no Farpas)

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